Perguntar-me-ia em primeira instância,
até para ser diplomata e estratégico, o que devo fazer, se se me meteu na
cachola que não se vive somente para isto ou aquilo e que, se se vive, é num
palácio que é preciso ser instalado? Essa é a minha vontade, isto é meu desejo,
instalar este palácio.
Quem seria
capaz de me arrancar esta vontade, podem tentar anula-la a partir da
perseguição, preconceito, marginalização, interesses mesquinhos e medíocres,
podem obscurece-la com máscaras e véus? Nada pode arrancar-me esta vontade
senão quando alguém perspicaz e inteligente tiver a ousadia de modificar os
meus desejos. Pois bem, direi com todas as palavras e letras legíveis:
“modificai-os, apresentai-me, senhores, outro fim, oferecei-me novas utopias e
sonhos, novos ideais”.
Enquanto espero
que me apresentem, ofereçam de coração e espírito, recuso-me a tomar um
chiqueiro por um palácio de cristal. Isto até por bom senso: o chiqueiro é
chiqueiro, palácio de cristal é palácio de cristal, a menos que esteja afastado
de minhas faculdades mentais, seja insano.
É sim possível
que o palácio de cristal não seja senão um mito, as leis do ponto e
natureza não o admitam e que eu o tenha
inventado, criado, para satisfazer os desejos de pilhéria e cinismo deslavado,
impelido por certos hábitos inconscientes e irracionais da nossa geração, não
creio os tenha trazido de outras.
O que
importaria, aqui e agora, que o castelo de cristal seja inadmissível,
ininteligível? Que me importa, pois que ele existe nos meus desejos –
construindo ou não construindo, em verdade -, ou, ainda para ser mais profundo,
mergulhar na semente de mamona, pois que o castelo de cristal existe tanto
quanto existem meus desejos?
Se me
apresentarem meios e estilos de o instalar, se me oferecerem as oportunidades
reais e concretas de fazê-lo, agradecerei a todos e oferecerei as mãos para o
sacrifico, sentir-me-ei feliz e realizado, instalei o castelo de cristal de
meus desejos.
Penso e imagino
que os leitores estejam caindo na gargalhada pela pilhéria sem limites, numa
linguagem e estilo clássicos, eruditos. “Ride até mais não podeis. Ofereço-me a
interromper por alguns segundos até que possais continuar a ler. Ride tanto
quanto vos faça felizes”.
Se me desnudo
diante de vós, apresento-me a vós com estes e aqueles desvios de toda ordem e
qualidade, ofereço-me numa taça de cristal para saborear-me num “à nossa”,
aceitarei todas as pilhérias, admitirei todas as zombarias, recusar-me-ei,
contudo, a declarar-me saciado das fomes milenares, sedes seculares, quando
ainda tenho fome e sede; não me contentarei com uma responsabilidade, com um
zero cada vez mais inclinando para a esquerda, renovando-se indefinidamente, pela
única e exclusivíssima razão de que está conforme as leis da diplomacia,
estratégia, os bons princípios.
Estivera numa
garagem, num princípio de noite chuvosa, conversando com o proprietário quem
tinha alguns galões de pinga. Disse-lhe com todas as letras: “Bem... Você já
conhece bem um lema, pode-se dizer lema, isto de termos de articular as nossas
preocupações e não nos afastar delas. Deste modo, não admitirei que o
coroamento de meu castelo de cristal de meus desejos possa ser um chiqueiro,
com alojamentos a preço módico no carnaval”.
Caíra na
gargalhada, talvez por haver compreendido e entendido que as bagas aqui não são
de infiéis e imbecis.
O que teria a
dizer, não me referindo as gargalhadas do amigo? Destruí meus desejos, derrubai
meus ideais, apresentai-me um fim melhor, a infidelidade e imbecilidade são
mais dignos, e eu vos seguirei.
Ah, sim, nestes
momentos de pilhéria, inda mais que não dirigido a alguns, aqueles e estes, mas
genericamente, a carapuça serve a uns e outros, dir-me-eis que não vale a pena
ocupardes-vos de mim, enfim quem sou e o que represento para ser tão
prepotente, arrogante, com o “rei-na-barriga”. Neste específico sentido, posso
garantir-vos que vos respondo do mesmo modo, até com uma pitada de pimenta.
Afianço-vos que
não admiro um poucochinho sequer em mostrar a língua. Se me dirijo a vós nesta
linguagem e estilo, é que outras não me são dadas saber, quem sabe por a língua
haver se desenvolvido bastante; não é que aprecie mostrar a língua.
Faria cortar a
minha língua com todo prazer e deleite, a medicina está muito evoluída para não
estancar o sangue, por gratidão mesmo, se se arranjassem as coisas de modo que
não mais fosse preciso dizer alguma coisa, causar polêmicas as mais sérias
possíveis e impossíveis.
Não me digais que
eu mesmo estou a renunciar o meu castelo de cristal muito cedo, pela única e
exclusivíssima razão de não lhe mostrar a língua. Que me importaria se as
coisas não se arranjarem assim, o castelo de cristal não seja instalado, tendo
de alugar um cantinho no chiqueiro, até com buchas de papel nas narinas para
não morrer cedo, isto se for possível chegar lá.
Digo-vos que
durante quarenta e sete anos, permaneci silencioso no meu canto, cuidando disto
e daquilo, tentando desvencilhar-me de inúmeras dificuldades, mas devido a sair
do buraco, falo, falo, falo...
Se vim para
dizer alguma coisa, então que seja para transformar, melhorar... Caso
contrário, não mereço nem o chiqueiro, e o pior de tudo é que sou eu quem
respondo pelo não-merecimento.
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