Explicações comem tempo e papel,
demoram a ação e acabam por enfadar, não apenas quem as ouve, lê, também quem
as dá, quem as escreve. O melhor é ouvir, ler com atenção. Se não ficarem
entendidas e compreendidas hoje, o tempo incumbir-se-á de esclarecê-las,
elucidá-las, a inteligência e sensibilidade no futuro serão outros, a alienação
de nosso presente terá sido extirpada. Se ficarem hoje, a semente foi plantada
aqui, tanto melhor: a inteligência e sensibilidade futuras, com efeito, serão
mais percucientes.
Não há quem não tenha passado
pela experiência do apelido nos tempos escolares. Se dava atenção, o apelido
pegava mesmo, a insatisfação seria eterna, quantos apelidos de homens já idosos
não prevalecem, de alguns nem se sabe o nome verdadeiro, por haverem importado,
brigado, batido e apanhado. Se não deram atenção, foi logo esquecido. No mesmo
patamar de análise, se se der atenção aos comentários negativos, depreciativos,
vai-se passar a vida inteira se explicando, defendendo-se. O melhor é assimilar
as críticas, crescer com elas. Só dou atenção às críticas, aos comentários
dou-lhes as costas, valorizo a minha soberania. Contudo, é preciso nalgumas
circunstâncias e situações res-pondê-las com categoria e propriedade.
Perguntemos: o que é “ler”. Ler
é entender e compreender as idéias, pensamentos, analisar e interpretar as
estruturas, molduras, mensagens de um texto, assimilar a sensibilidade e
espiritualidade do conhecimento, buscar transformações da condição e natureza
humanas, mudanças de posturas, condutas morais e éticas. Ler é con-templar o
conhecimento, é buscar saciar a sede de VIDA.
Quem, nestas perspectivas, sabe
ler em nossa modernidade? Resposta dura e seca: ninguém. Antigamente, o
analfabeto era quem não sabia ler, hoje, há mais analfabetos que antigamente,
ler aprenderam, mas não sabem o que é ler. Em qualquer nível do conhecimento,
ninguém sabe interpretar e analisar o que é lido, são opiniões chinfrins,
pontos de vista medíocres, mesquinhos. Em Literatura, a questão é ainda mais
complicada. Costuma-se dizer que as verdadeiras responsáveis são as pessoas,
pois não gostam de ler, são preguiçosas; se lêem alguma coisa, lêem justamente
as porcarias, não é preciso pensar, refletir, meditar sobre a leitura. Nas
prateleiras das livrarias, difícil é encontrar Balzac, Stendhal, Dostoiévski, Virgílio
Ferreira, Victor Hugo, Machado de Assis, Gregório de Matos, etc., etc. – tais
leituras são privilégios de intelectuais, escritores, doutores, especialistas, homens
da cultura, e são a minoria, não trazem resultados para as editoras -, encontra-se
em série José Saramago, Paulo Coelho, as maiores porcarias do mercado, (não li,
não gostei), há outros que andam ombro a ombro com eles. Recentemente, o poeta Ivo Pereira pediu-me
emprestado A mulher de trinta, Balzac, prometeu a uma amiga e não
encontra a obra em livrarias. Prometi-lhe emprestá-lo. As condições editoriais
no Brasil está uma vergonha pública: só se publica o que dá retorno às
editoras, e o retorno só vem com as porcarias. Em termos, isto é verdade: o
conhecimento profundo das coisas, da vida, não tem qualquer cabimento em nosso
mundo, o importante mesmo são os bens materiais, o dinheiro no bolso, o
conforto que eles proporcionam.
Há-de se considerar o que
ninguém tem coragem suficiente para dizer com todas as letras. Os alunos, as
pessoas são responsáveis, mas a responsabilidade maior se encontra no sistema
de ensino. Os professores nada sabem de literatura, para eles e para o sistema
o importante são aquelas velhas e surradas características dos períodos
literários, o estudo se concentra nisso desde tempos imemoriais, estudo
inferior, deturpado, adulterado. Para se saber, conhecer o que é isto
Literatura só mesmo com os conhecimentos filosóficos, teológicos, e eles nada
sabem disso. Só tive em toda a minha vida de estudante uma professora realmente
conhecedora da Literatura, Vilma Simões, curvelana, ex-professora do Instituto
Santo Antônio, Escola Estadual Bolivar de Freitas, seus conhecimentos e eficiência
influenciaram-me na vida de estudante, na vida de escritor. A pior de todas foi
Neide Mourthé, professora do Colégio Padre Curvelo. Os outros professores, em
todos os níveis do ensino, mesmo na faculdade, eram péssimos, nem sabiam por
onde passa a Literatura. Os conhecimentos que adquiriram foram para lhes
garantir a cadeira no magistério, receberem o salário no final do mês. Nada
mais.
Meus conhecimentos intelectuais
não se reduzem a apenas alguns autores, críticos, ensaístas da literatura.
Conheço a literatura universal, a filosofia universal, a teologia. Ao longo dos
anos e das experiências, fiz a síntese destes pensamentos na minha escritura,
assim tornei-me soberano (como tão bem escreveu a respeito o poeta Advaldo da
Conceição), minha autenticidade, originalidade – não há quem em Curvelo na
modernidade escreva na minha linguagem e estilo, e não haverá nos próximos
cinqüenta anos, senão cem, só por milagre, e ele é possível, depende unicamente
de Deus, no meu caso foi-me dada esta missão, Deus escolheu-me, no futuro
escolherá outro, talvez não.
Por longos anos, nove,
eventualmente ou não, servi-me de tablóides para a divulgação de minha obra
literária-filosófica-teológica, era o único meio de que dispunha. Editores nos
meus ouvidos falando por causa da linguagem e estilo, negando-se a publicar
meus textos, tinha que escrever para o povo, tinha que falar a língua das
massas. Para eles, para a mídia, ser escritor, ser artista é entrar no jogo da
“mídia”, o objetivo deles é alienar o povo. Dostoiévski dizia que o
intelectual, o escritor tem a obrigação de ler jornais – ressalte-se: no seu
tempo. Hoje, se se quiser preservar a consciência, visão de mundo,
inteligência, sensibilidade, deve-se não ler jornais, revistas. Só assim se
entra na história, só assim se torna eterno e imortal, só assim é famoso,
desfruta do sucesso, põe mais alguns vinténs no bolso, para satisfazer os
caprichos e mazelas.
Mendiguei, ajoelhei, roguei,
pedi pelo amor de Deus aos editores para publicarem meus trabalhos. Não aceitei
as exigências, mas fui condenado a ouvi-las por todos esses anos. Fossem só
eles, seria até inteligível. Mas advieram aqueles que se dizem escritores,
ostentam valores supremos da importância na cultura, nas artes, com as suas
divulgações: “Ninguém entende o que ele escreve”, “ele só escreve para a fina
nata da cultura”, “ele só escreve para doutores, especialistas, críticos,
intelectuais, homens cultos”. Qual a razão de eles saírem divulgando isto a
todos os ventos, a todos os cantos, esquinas, botequins, reuniões, eventos
sociais e artísticos? Ciúme, inveja. Sabem que é impossível seguir-me os passos,
plagiar-me, até mesmo copiar-me. Sabem com percuciência que a minha cadeira no
Olimpo está mais do que garantida, e querem o seu quinhão. Já saíram até divulgando
meu estado de saúde, enfarto, queriam-me morto, assim o lugar deste néscio e
imbecil não estaria sendo questionado. Já havia divulgado que eu jamais
escreveria outra obra como Ópera do Silêncio, não conseguiu realizar seus
propósitos, experimentou divulgar meu estado de saúde. Para sua ciência e
conhecimento, Sendeiro da Luz Eterna já foi considerado pela crítica paulistana
obra-prima. Em breve, será publicado em livro. Se houvesse morrido com este primeiro enfarto,
meu nome já seria eterno, radicalmente imortal. Minha missão de escritor não é
com apenas alguns textos, devo ainda escrever inúmeros. Mas a inteligência nos
tempos modernos é privilégio de poucos.
Razão In-versa nasceu nas
páginas do tablóide E agora? Foram publicadas três edições, com o apoio,
participação, patrocínio de empresários, a quem agradecemos sobremodo,
somos-lhes eternamente gratos. Suplemento-caderno literário, apesar de figurar
em jornais, tablóides, tem sua linguagem e estilo próprio, intelectual, culta.
Razão In-versa não podia continuar sendo publicado em tablóides, tinha de ter
vida própria, necessitava ser soberano, autônomo, original, não só para
satisfazer os meus propósitos, mas de toda a equipe que nele escreve.
Assim, tornamo-nos
independentes. Saímos do tablóide E agora? Recentemente, seu diretor, Geraldo
Magela de Abreu, recorrera a interferência do amigo e Sargento da Polícia
Militar, Raimundo de Oliveira, para persuadir-me a retornar a escrever no
tablóide. Esta comunhão é impossível. Por que vou encarcerar uma coisa que por
natureza e condição é livre? Disse-lhe que eventualmente poderia escrever
alguma matéria, não em uma coluna minha, não estava voltando ao tablóide.
Aliás, escrevi matéria sobre um feito humanístico de Raimundo de Oliveira, já
publicado. Não escrevo mais em tablóides. Minha querida e mui estimada amiga D.
Ernestina Barbosa, escreveu-me pedindo que comungasse Razão In-versa ao E
agora, devido à importância de minha literatura, as pessoas tinham de conhecer
o meu pensamento, a minha obra, ser mais divulgada. Apesar de minha
consideração e amizade a D. Ernestina Barbosa, essa comunhão é impossível
mesmo.
A mídia é para quem está
reivindicando sucesso, fama, ter vinténs no bolso. Para mim, a mídia é nada,
jamais me proporcionará o que realmente desejo, não tem competência para isso.
Há quem realmente está interessado nisso. Há quem está morrendo de vontade de
entrar na imprensa, divulgar seus trabalhos. Faça-o. Desejo-lhes boa sorte. São
estes que devem escrever em tablóides, entrar na mídia. Contudo, a eternidade
não lhes será garantida. Só o que transcende os tempos, gerações fica na
eternidade. O resto é esquecido, sua própria natureza é efêmera. Quanto a minha
obra, tenho consciência de que já é eterna, mesmo com todos os comentários
depreciativos, negativos. No futuro, daqui a alguns séculos, será plenamente
reconhecida.
“Ao leitor”, em Memórias
Póstumas de Brás Cubas, Machado de Assis assim escrevera: “Que Stendhal
confessasse haver escrito um de seus livros para cem leitores, cousa é que
admira e consterna. O que não admira, nem provavelmente consternará é se este
outro livro não tiver os cem leitores de Stendhal, nem cinqüenta, nem vinte, e
quando muito, dez”. Que a minha obra seja lida hoje por cinco, mas tenho a
consciência de que estes cinco sabem mesmo ler, sabem mesmo o que é isto
Literatura verdadeira. Já me dou por satisfeito. Mas, em verdade,
Suplemento-caderno Literário Razão In-versa já tem quinze leitores neste
nível.
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