O
amor é a síntese mental que procede do simples para o complexo; é um leque de prazeres.
Antônio Nilzo Duarte – Sentimentos da Esperança
Todos guardamos recordações que só ousaríamos
re-velar a amigos íntimos, a algum parente a quem amamos de modo especial e em
quem confiamos. Há outras, porém, que nem a amigos íntimos poderíamos re velar,
mas apenas a nós mesmos, e, ainda assim, no maior sigilo.
Há coisas que temos medo de dizer a nós mesmos, e
todos, até os mais honestos, acumulamos uma boa quantidade delas. Melhor ainda: quanto mais honesto for
o homem mais terá dessas coisas. Em todo caso, Nilzo Duarte decidiu escrever
suas memórias, a história de sua vida ao
lado de sua amada e venerada esposa e amados filhos – como ele próprio diz
“dona Neusa”, dotado dos sentimentos da “virtude, sabedoria e inteligência” –
reconhece-se aqui a sua profundidade cristã e humanística: são elas dimensões
divinas e quem a elas se entrega os frutos serão alimentos eternos. Agora que
se decidiu a escrevê-las, quer experimentar a possibilidade de ser inteiramente
sincero para consigo mesmo e não temer a verdade total.
O que é isto – a verdade total? Dizer aberta e lucidamente todas as
coisas, sem medos e sentimentos de vergonha?
O que justificaria tal atitude? Tais atitudes necessitam de fundamentos,
de algo que as justifique. A pedra angular de suas memórias é o amor verdadeiro
e espiritual por “dona Neusa” e seus filhos. Mergulhando no íntimo, no âmago de
sua alma espírito, conhecer a verdade, a verdade que lhe habita – ou melhor,
conhecer o amor, o seu estilo e linguagem do amor, o seu modo de entregar-se, tornar-se
amor, tornar este amora sua verdadeira carne. E o que é amar?É querer bem ao
outro, desejar-lhe felicidade, alegria, real-ização dos sonhos e desejos.
Amar “tem o
calor veemente”- calor que se sente no sangue que per-corre as veias em
todo o corpo, e este sangue “quente” e
“efusivo” envolve a alma de esplendor, plen-itude, éter-(n)-idade, configurados e simbolizados na devoção, na experiência
própria de busca do místico, do silêncio e do deserto que re-velam a
grandeza da interioridade dos
sentimentos divinos que habitam o peito de Nilzo Duarte, de todos nós os
homens, criaturas de Deus que somos.
O itinerário de escritura de suas memórias, desde o
primeiro volume – são três – segue a trilha do caminho do campo, isto é, do
simples para o complexo, num movimento de ascensão, elevação sensível, do
vivido, experienciado na contingência, para o desejado, querido, a
espiritualidade, eivado de sentimentos e emoções que, às vezes, deixa-lhe
suspenso no interior da felicidade e do tédio, da alegria e da tristeza, do
prazer e melancolia, mas que re-vela a
verdade a que aspira, quando os verdadeiros sentimentos de felicidade interior se concretizam.
A liberdade, sabia-o desde a primeira palavra que
registrara, tornar-lhe-ia verdadeiro, a verdade o tornaria livre. A esperança
de mergulhar em seu amor por “dona Neusa” dizia-lhe uma voz profunda e meiga, fá-lo-ia real-izar o
encontro com a mulher a quem tanto amou, encontro espiritual – o encontro do
amor “puramente verdadeiro, este nasce espontaneamente de nosso coração e se
sentirá resguardado em nosso peito, por tempo ilimitado”.
Com o sentimento de amor – que foi sendo re-velado,
manifestado, dito, ao longo dos anos que
estivera voltado exclusivamente para a escritura de suas memórias, crescendo,
amadurecendo, real-izando-se divinamente nos sentimentos interiores – o mundo
para Nilzo Duarte trans-figurou-se, trans-formou-se, trans-mudou-se, re-vestiu-se
de felicidade, alegria, de tal forma que sentiu não ter lugar no uni-verso para
ele, pois que era homem quem admitia, reconhecia de modo sincero, real e sério
que todos os vislumbres desse amor por “dona Neusa” notabilizaram-lhe o
espírito e a vida que viveu.
Notabilizar o espírito, a vida, tem uma “constante”
esperança”, são Sentimentos da esperança – título da obra que id-(ent)-ifica
com clareza e transparência os desejos que habitam o coração de Nilzo Duarte,
isto é, o amor lhe dera a possibilidade e oportunidade de penetrar na esperança
e mostrar os sentimentos que nela habitam – que sensibiliza o íntimo, reflete a
luminosidade, ao ser oferecido o visual surpreendente do que significa isto
“amar” alguém, dedicar-lhe a vida
inteira. O clarão desta notabilização do espírito e da vida emite a
singularidade do espírito, oferecendo aos homens as águas cristalinas da
espiritualidade, “intensidade espiritual que talvez não se possa explicar”, mas
que abriga os segredos e mistérios das criaturas humanas sedentas da redenção e
ressurreição. O amor é a trilha do campo que nos leva e eleva a Deus.
[1]
Esta crítica ao livro de Antônio Nilzo Duarte foi pela primeira vez publicada
pelo tablóide E agora?, Setembro/Outubro de 2008, Edição 34. Re-publicando
textos, não há não fazer algumas modific ações, no sentido de tirar as
“gordurinhas”, acrescentar palavra aqui e ali, dividir algumas com hífen, para
alcançar a profundidade que fora pensada
no momento da escrita e não realizada. Fora neste artigo que comecei a
assinar o meu nome artístico Manoel Ferreira Lemos.
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