As primeiras letras deste título
formam uma palavra esplêndida, maravilhosa, da água na boca – de outrem, pois
que não gosto, aprecio mesmo é o sal -, o sonho de a vida ser doce, agradável,
palco de todas as real-izações conting-“entes” e/ou materiais, espirituais ou
quotidianas, a felicidade plena, absoluta, só prazeres e alegrias, verdadeiro
“mel” – o que as primeiras letras do título formam, que, aliás, des-cobri, após
haver escrito; já pensou a vida melada de fio a pavio?! Resta saber se os
homens iriam adaptar-se, enfim só mel enfastia-, afadiga, ninguém consegue
viver só de felicidade, as gotículas de fel são necessárias, são o húmus para a
busca de superações, lutas a favor dos sonhos concretizados. Mel e fel são o
tempero divino para a vida, assim chega-se a real-izar com perfeição a busca do
sonho do Paraíso Celestial. Mel antídoto do fel, fel antídoto do mel. Mistura
perfeita.
Não foi para falar em mel, em
fel, que me dis-pus nesta manhã de final de maio, restando apenas cinco dias
para o início de junho, que me dis-pus a criar este título, sem antes escrever,
melhor dizendo, o que iria dizer a respeito dos mistérios do espírito e liberdade
e, para ganhar tempo, enquanto não se me a-nuncia com clareza e transparência a
moldura e estrutura de minhas idéias, decidi tecer estas considerações
preliminares. Ainda não o sei, vou escrevendo sob o signo da pena deslizando no
papel sem qualquer interrupção, sem tomar fôlego entre uma palavra e outra,
entre uma vírgula e uma idéia, um ponto e vírgula e um pensamento, um cinismo e
sarcasmo, um sentimento negativo e uma ironia, uma emoção frustrada, a
real-ização daqueles textos que nascem feitos, resta apenas o registro e depois
aquela mais que famosa dúvida: “Fui eu mesmo quem escreveu isto?”
Dis-pus-me a escrever sobre os
“mistérios do espírito e liberdade”, mistérios que deixam os homens em suspenso
por toda a vida, ninguém consegue des-vendá-los, de-cifrá-los, analisá-los e
in-terpretá-los, ninguém consegue entendê-los e com-preendê-los mesmo à luz dos
preceitos e dogmas católicos, mesmo sob o ângulo dos princípios filosóficos e
teológicos, dos dogmas e preceitos “igrejísticos”, mesmo na perspectiva dos
modernos livros de “auto-ajuda”. Os mistérios são mel da vida, a “felidade”
deles estimula a busca, os sonhos e utopias di-versas e ad-versas, o desejo
pujante das alegrias e felicidades.
A pré-liminar desta con-sideração
vai muito longe, ultrapassa os limites do bom senso, deixando o leitor
impaciente e irritado, enfastiado e fadigado, só mostro elucubrações, o bom
mesmo que é a clareza das idéias, a transparência dos objetivos e interesses
são o que menos aparece. Não continuarão mais a ler, estão perdendo tempo com a
leitura, nada encontrarão nestas palavras que sejam húmus ou sementes para
com-preenderem os mistérios, superar-lhes, viverem, vivenciarem, experimentarem
outros horizontes e uni-versos da vida espiritual, conting-“ente” que desperta
para outras real-idades do corpo e alma.
Vejamos, então, como tecer os
mistérios do espírito e liberdade, sem dar voltas no cogito, sem encher
lingüiça, sem elucubrar, sem achar que encher páginas e mais páginas de
palavras inibem as angústias, depressões, preenchem o vazio da alma pela falta
de res-postas percucientes para os problemas da vida e da existência.
Lembram-me os professores que escrever uma redação de excelente qualidade
faz-se com poucas palavras. Lembrança apenas, pois que eles não tinham qualquer
noção do que é isto – escrever. A questão é incólume e insofismática: os
mistérios do espírito e liberdade. Eis o tema que resolvi tratar neste dia de
maio, vinte e seis, restando apenas cinco dias para a sua consumação, iniciando
o mês de junho.
Embora o leitor esteja imaginando
que esta preliminar tenha sido escrita em poucos minutos, não tive qualquer
dificuldade, a pena deslizou no papel livre e espontânea, não gastei mais do
que dez minutos no esboço e elaboração, já gastei quarenta e cinco minutos,
três pingas e vários goles de única cerveja. O que justifica isto é a mudança
de perspectivas de minha escrita – enfim sou obrigado a re-(n)-ovar-me a todo
momento, se desejo ganhar o meu pão de cada dia com as letras. Nem sempre a
in-ov-ação, re-(n)-ov-ação são possíveis, os leitores cansam-se, afadigam-se do
mesmo, adeus sonho de comer, beber, sustentar a vida com as letras, restando-me
apenas sentar-me à porta de uma igreja com um pratinho e esperar as moedas
tilintarem, possa sobreviver, não passe fome, não durma ao relento nalgum banco
de praça, calçada, construção abandonada.
Eu quem sou? Sou o século, sou o
milênio que passa. Eu quem sou? Sou as dores e sofrimentos que me acompanham,
as buscas e sonhos que me habitam o espírito e alma. Quem somos os homens? A
multidão fremente. Que canto? A glória resplendente, o reconhecimento.
Quero transportar-me ao verso
doce e ameno as sensações de minha idade. A folha branca, límpida, vazia de
todo, pede-me inspiração e engenhosidade na escrita das letras, frouxa e manca.
A pena não acode ao gesto meu, nem mesmo as palavras sábias e percucientes são
húmus de outros sonhos e utopias, já que me esqueceu depois da cerveja e doses
de pinga, três, o meu limite em todas as manhãs.
Onde os tempos não são a quimera,
fantasia, ilusão, imaginação fértil, que apenas brilham e logo se esvaecem,
como folhas de escassa, exígua primavera. Onde nada se perde nem se esquece, e,
no dorso dos séculos, permanecem os mistérios do espírito e liberdade.
Escolho o uni-verso, as idéias
ambíguas e di-versas, para intro-duzir, o re-verso de pro-duzir ou im-produzir,
a pena e tinta para escrever.
Fui ontem visitar a sepultura de
minha mãe que morreu recentemente, vítima de câncer no estômago, tendo se
submetido a quatro cirurgias, usado “bombinha”, sofrera muito, padecera mesmo.
A visitação de sepulturas é um bom costume católico, mas não há trigo sem joio.
Na visitação, tudo e joio sem trigo. Infelizmente, as minhas culpas, remorsos,
pecados da estirpe estarão presentes por toda a vida, seguir-me-ão passo a
passo. Disse-lhe: “Embora tenha sido uma
situação um tanto constrangedora, você não podia ser enterrada na sepultura da
família, pois não podia abri-la, fora enterrado outro cadáver ali faz dois
anos. Não podia ser enterrada noutra sepultura, de seu sobrinho, pois falecera
a três anos. Para reabrir é preciso de cinco anos, tempo suficiente para a
decomposição total do cadáver. Em verdade, foi bom haver sido enterrada em
sepultura alheia, da ex-mulher de LS. Você sofreu muito com a família, sua
sogra queria ver o demônio ao invés de você. Eu mesmo não serei enterrado na
sepultura desta família, nem mesmo na cidade. Quero sê-lo na sepultura de minha
mãe verdadeira, você foi biológica. Sua sogra desejou-me a morte quando nascera
doente”.
O poeta que sou, o escritor que
pretendo ser, garantindo-me a eternidade e imortalidade, por todo o sempre
objeto de interpretações e análises.
Numa das portas do Cemitério das
Palmeiras, há este lema: “Revertere ad locum tuum”, que tomo a liberdade de espírito
e palavras em separar, o que nunca vi, uma característica de meu estilo
percuciente e in-verso: “Re-vertere ad locum mutuu”; mergulhe nisto quem
quiser, que não pretende obter res-postas, mas acumular dúvidas acerca da vida
e de seus mistérios.
Quando ao cemitério vou, não
deixo de ler essas palavras, se epitáfio não sei, se homenagem à vida e aos
seus sonhos de real-ização, que resumem todo o resultado das labutações da
vida, também não tenho a mínima noção. O poeta que sou o diz com sapiência e sabedoria,
se o colorido das imagens e estruturas, dos conceitos e definições, das buscas
e utopias, não sei se mais filosofia ou meramente idéias e pensamentos que
servem às carências da vida e do momento, a verdade é que jamais me será
possível, mesmo que viva tanto quanto ou mais que Noé para des-vendar os
mistérios do espírito e liberdade.
Não sou capaz, sê-lo-á outro
homem nos tempos desta modernidade em que vivemos, lutamos pelo nosso pão de
cada dia, empreendemos todos os esforços e lutas para superarmos nossas
dificuldades e impossibilidades de escrever com percuciência e senso crítico
sobre os mistérios do espírito e liberdade, quem sabe sendo possível só depois
de minha morte, escrever o meu memorial de defunto como o fizera Brás Cubas, o
único que descambou para estas conclusões da vida e morte?
Mas, para não terminar este
escrito de modo suspenso e arbitrário, registro uma fala do filho da
proprietária deste bar, após ler eu um de meus textos, dissera-me com toda a
categoria: “Suas letras parecem com as de Machado de Assis. Você está se
tornando outro Machado, com a diferença de suas letras haverem sido escritas na
segunda metade do século XIX, e as que você escreve no princípio, primeira
década do XXI, os mistérios continuam a todo vapor, a liberdade e o espírito
continuam presente nos ideais da estirpe e laia humanas”
Tristeza, por favor, vá embora,
não são as lágrimas que descem no rosto, não é o choro compulsivo que se
re-vela... O que impera mesmo com categoria e efusividade é o desejo de fotografar
a vida nas suas di-versas e ad-versas manifestações, e eu com toda a capacidade
e talento com as letras não sou capaz de mudar a realidade dos mistérios que
habitam a alma e espírito humanos, sou escrava dessa nossa moderna que é a
inconsciência.
Nenhum comentário:
Postar um comentário