Não poderia mesmo escrever comentário ou crítica no que tange aos textos
da comadre Nininha, publicados na edição anterior e nesta, pois que se faria
mister haver lido a obra de Paulo Freire a que ela se refere, assistir aos
filmes. Já escrevi o pré-facio das cartas trocadas entre Antônio Nilzo Duarte e
sua esposa, sem as haver lido – em breve, sairá este pré-facio, que, aliás, o
seu lançamento já está reservado a este suplemento -. mas conhecia as três
obras publicadas, para a última Sentimentos da esperança escrevera a apresentação, tinha condições de
fazê-lo, con-vivo com o autor faz dois anos e cinco meses.
Sinto mesmo enorme falta de residir em São Paulo, con-viver com os intelectuais,
escritores, adquirir novas experiências, vivências, amadurecer a minha
consciência-estética-ética – durante o tempo que lá residi con-vivi com João
Hansen, Antônio Pasta Júnior, e outros, professores da Universidade de Paulo,
artistas de teatro -, adquirir obras, assistir a filmes e peças de teatro,
também discutir as obras lidas com o compadre. Posso encomendar obras como estas cartas de
Freire por uma livraria em Belo Horizonte, o que farei em breve, mas estes
filmes que são analisados e interpretados pela comadre não se encontram nas
locadoras em Curvelo, Diamantina. Certa vez, dissera ao compadre Paulo César
que, infelizmente, não poderia conhecer os autores inéditos de São Paulo, mas
estava feliz por estar lendo as obras de nossos escritores curvelanos,
escrevendo sobre eles. Replicara dizendo que poderia encomendá-las pela
Internet – tenho nojo, asco, ojeriza de Internet, para encontrar porcaria não é
necessário ligar o computador, mas para encontrar coisas interessantes leva-se
um século. Já tive, mas, irritado com a demora de encontrar o que procurava,
deixei de pagar a mensalidade.
Digitando os trabalhos da comadre, pensei comigo era necessário explicar
algumas questões, esclarecê-las para os leitores.
Venho publicando os textos do compadre, retirados de suas obras a mim
doadas com muito carinho e amor, não apenas para engrandecer o suplemento, mas
porque para ele vir a Curvelo divulgar sua obra é dificílimo, é um intelectual
bastante atarefado, cheio de aulas, palestras e bancas examinadoras. Não lhe
sobra qualquer tempo. Faz tempo que venho insistindo com ele para escrever
textos novos e enviar-me, não tem tempo. Às vezes, pelo telefone, deixo recado,
chamando-lhe, de brincadeira, preguiçoso. Por que não levantar de madrugada
para escrever?
Já afirmei nalguma edição deste suplemento a obra teórica que mais me
influenciou na minha carreira não apenas de escritor, mas de crítico literário
fora a sua dissertação de mestrado, publicada pela Voz, em 27 de maio de 1997, Utopia
cristã no sertão mineiro, uma leitura de
A hora e vez de Augusto Matraga, João Guimarães Rosa; então, a Introdução amo de paixão.
Nesta obra, Paulo César de-monstra todo o seu pensamento da
consciência-estética-ética, que me influenciara desde que começara a ler no dia
28 de maio de 1997, dia após o seu lançamento na livraria da Vozes na rua
Haddock Lobo, travessia da Avenida Paulista. Embora nossas vidas intelectuais
sejam bem diferentes no que concerne às nossas posturas, há algumas dimensões
semelhantes.
Verdade é que Simone de Beauvoir, a eterna companheira do filósofo
Jean-Paul Sartre, para escrever seus dois volumes de O segundo sexo,
fundamentou-se em dimensões do pensamento sartreano, inspirando-se, o que
serviu de crítica por parte de alguns intelectuais franceses. Embora toda a
fundamentação dela na obra sartreana, há a originalidade e autenticidade da
escritora. Muitos intelectuais têm o hábito de fazer críticas para roubarem a
cena, para se tornarem ainda mais re-conhecidos, prática que, na minha concepção,
é deveras ridícula. Roubar cena é o prato preferido no métier intelectual.
O leitor deste suplemento que vem lendo os capítulos das obras do
compadre Paulo César, mesmo que não tenha conhecimentos aprofundamentos de
filosofia, teologia, literatura, psicologia, percebe e intui a dimensão da
consciência-estética-etica em toda a sua obra, é a pedra angular, a pedra de
toque de seu pensamento, de sua vida íntima e particular.
Agora, lendo os textos, não literários, como os cinco contos de natal,
já publicados neste suplemento, mas os textos históricos, resenhas de filmes,
de textos teóricos, como já disse, mesmo que não tenha conhecimentos
aprofundados da consciência-estética-ética, também percebe esta dimensão no
pensamento da comadre Nívea Maria Matteocci.
Conversando com a doce-companheira-e-senhora e poetisa Marize Lemos
Silva a este respeito, dissera não pensar ser necessária esta explicação, o
leitor não iria atinar com isto. Repliquei, dizendo que, mesmo os leitores não
tendo conhecimentos a priori da consciência-estética-etica, exige conhecimentos
profundos, profundíssimos de filosofia e teologia, intuem e percebem. O leitor
não abana as orelhas como alguns têm o hábito de afirmar com prepotência – já
ouvi diretor de tablóide dizer quem menos apita no tablóide é o leitor; existem
estes imbecis, inevitavelmente. São, às vezes, mais sensíveis que nós os
escritores, teóricos, críticos, percebem e intuem coisas que nós nunca iríamos
pensar ou imaginar. Prova disso fora a poetisa Marize Lemos Silva que encontrou
o que não havia eu – não tem ela qualquer conhecimento de literatura,
filosofia, teologia, não lê a este respeito, não gosta -, até então, conseguido
fazer, conceituar o que é isto, Razão In-versa, fora o poeta Advaldo Cardoso
Filho, em sua análise e interpretação deste suplemento, dizer “Até que nos
aparece a RAZÃO IN-VERSA, invertendo a lógica e subvertendo a ordem (ou,
invertendo a ordem e subvertendo a lógica)! Este Suplemento é, no seu conjunto,
uma metalinguagem”. Jamais iria atinar com esta inversão da lógica e subversão
da ordem, vice-versa, não fosse o poeta Advaldo Cardoso Filho se lhe referir
com categoria, o que vem contribuindo bastante na escritura dos textos meus e
na composição do suplemento.
Separemos o trigo do joio. Nívea Maria Matteocci é graduada em História,
professora de escola estadual em São Paulo. Possui conhecimentos aprofundados
desta disciplina. Por mais que Paulo César também tenha conhecimentos de
História, não é graduado. Inegável, lendo os textos da comadre, perceber certas
influências do marido no que tange à consciência-estética-ética – são
estudiosos, têm o costume de ler obras juntos, discutirem, analisarem,
interpretarem. Contudo, há uma diferença primordial entre um e outro. A
consciência-estética-ética de Paulo César está intrinsecamente ligada aos seus
estudos literários, filosóficos, psicológicos. No concernente a Nívea Maria
Matteocci, embora a influência, há uma inversão; ao invés da consciência-estética-ética,
encontra-se a consciência-ética-estética. E por quê? Em termos de História a
ética prevalece, vem primeiro. Elaborada a ética na análise histórica, é que se
busca a estética, isto é, a harmonia entre a realidade e a dimensão das
análises e interpretações dialéticas da história. Poder-se-ia até afirmar que é
com a dimensão ética e estética que esta dialética encontra o seu movimento no
de-curso, per-curso, trans-curso histórico.
Far-se-ia mister todo uma análise percuciente desta dimensão do
pensamento da comadre, através da História, mas não tenho qualquer condição de
fazê-lo, embora tenha eu condições de fazê-lo através do pensamento marxiano,
não marxista. Já o disse antes, o que mais me irrita é ler livros históricos, a
linguagem me deixa realmente bestificado, muitas vezes não entendo o que se
quer discutir. Em 2003, aquando publiquei a minha dissertação em Sartre,
Alteridade do outro em Sartre, enviei para os compadres. Numa conversa via
telefone, perguntei-lhe se já havia lido, respondendo-me: “Não gosto de ler
filosofia”. A estrutura e moldura de uma
“explicação di-versa”, como é o caso aqui, tecer tais considerações não cabe.
A minha pré-ocupação, tendo lido, digitado, com atenção os seus textos,
era com o leitor fazer relações entre Nívea Maria Matteocci e Paulo César
Lopes, casados que são, dizerem e afirmarem a todos os ventos ela estar mais do
que influenciada, tudo o que escreve é nele fundamentado e inspirado,
negando-lhe a autenticidade e originalidade. Tal procedimento prejudica a
leitura percuciente da obra, prejudica sua estrutura e obra, prejudica
encontrar-lhe as posturas e condutas da interpretação. O leitor jamais irá
poder mergulhar profundo no pensamento que a obra apresenta, e assim o que é
buscado, isto é, modos e meios de transcender a realidade, trans-formando a
vida e o quotidiano, espiritualidade, são esquecidos.
Recomendo aos leitores deste suplemento, especialmente os professores de
História, lerem as cartas de Freire, como diz a autora são interessantíssimas
para uma avaliação pedagógica freiriana da História. Recomendo também
assistirem aos filmes, caso seja possível adquirir-lhes nalguma locadora em
Belo Horizonte.
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