Aos
coveiros do Cemitério das Palmeiras, Curvelo.
Manifesta-se primeiro nas orelhas, não através de calafrio, eriçando os
tênues pelos, por intermédio de vento vindo do sul, mas através de algumas
notas musicais, lembrando a valsa das “bodas de ganache”, tomando todo o corpo
até chegar às patas ou aos pés, quando o início se efetiva, e daí nada mais se
mostra ativo e relevante, impera; os sentimentos e emoções são outros, a vida
são sonhos e fantasias os mais esplendorosos e divinos, o espírito se re-vela
sereno e tranqüilo, a respiração lenta, os olhos não perscrutam qualquer coisa,
visão de nada, o coração bate devagar, o corpo inteiro leve.
A providência, em seus inescrutáveis desígnios, tinha assentada
legar-me, doar-me benefício maior que esta da valsa das “bodas de ganache”,
quando se me revela, se me manifesta nas orelhas, terminando nos pés – o número
de sapato sendo trinta e oito não é grande o suficiente para ser tido e havido
como pata; passando de quarenta e quatro, sim, alguns amenizando a força da
palavra chamam-lhe “chulapa”. Nenhum lhe pareceu, à providência, maior nem
melhor do que certo gozo superfino, espiritual e grave, que patenteasse a
brandura dos costumes, a graça das maneiras: deu-me as mãos cheias de dedos,
cinco em cada, com direito às unhas, devendo sempre apará-las com esmero.
Em nada o limite deve ser olvidado, olvidar-lhe é acabar com todas as
atividades, é estabelecer a ociosidade, a coisa existe apenas por existir. O
fruto proibido era o limite das felicidades e prazer de Adão e Eva no Paraíso –
refiro-me a isto para estabelecer a origem e início do limite que o tempo e as
situações humanas ampliaram, multiplicaram; o limite habita todas as coisas,
des-cobrindo assim a fronteira da angústia espiritual ser a morte do corpo, a
vida mesma aí começa, a liberdade espiritual impera sob quaisquer ângulos de
inter-pretação ou análise, são os limites todos exterminados e não apenas
olvidados, a penas subestimados.
Somente a mão direita, que não é só cultura, mas raiz profunda do
“credo” – “à mão direita de Deus-Pai” -, iria tornar possível a-nunciação – se
com espírito de per-severança, fé, esperança, sonhos e desejos os mais
presentes e vivos seriam trans-formados -, re-velação, re-presentação das notas
musicais que iniciam as “bodas de ganache”.
Não seria fácil, teria de entregar-me por inteiro, lutar mais que peão
preparando a terra sob sol cáustico, suor pingando – suor não faz rio, fecunda
a terra, lágrimas não fazem oceano, refrescam a face, descansam os olhos das
neurastenias íntimas. Embora toda a luta, apesar de todas as entregas, não
poderia jamais dizer a mão direita não mais ser movimentos, gestos, burilações,
delineações de suas vontades e desejos da obra eterna e imortal – em quaisquer
panoramas e perspectivas é a mão direita que faz a vida, a esquerda apenas
contribui e ajuda nos limites que se apresentam na continuidade do tempo em
busca do “ser”. A mão direita se
trans-formara em engenho, em habilidade, em última instância, o auge da arte,
construído com sonhos de registrar, através do ritmo, musicalidade, a valsa das
“bodas de ganache”: a mão direita era a divinidade e divindade do espírito, a
mão direita era o eterno e imortal, a mão direita era a vida. O que é não se
torna e o que se torna não é, como certa vez lera esta idéia escrita por uma
direita mão que vangloriava, endeusava o ápice do espírito quando se entrega
inteiro à crítica e ás galhofas do poder.
Estando em Curvelo agora mesmo sentado numa mesa de restaurante,
escrevendo estas linhas, preenchendo-as com letras, enquanto tomo cerveja e
aperitivo, um coveiro do Cemitério das Palmeiras aproximou-se dizendo que me
tem observado sempre nas visitas à sepultura de minha mãe, quando não rezo,
con-verso com ela, perguntando-me se não lhe podia ajudar com a quantia de dois
reais, suficiente para inteirar o seu almoço. Tirei da carteira a nota,
entregando-lhe, que recebeu com a mão direita. Pedi-lhe, então, que rogasse e
rezasse ás almas para me ajudarem, o que me res-pondeu, creio, sem pensar: “sua
mão direita é o espírito”.
Esta res-posta deixou-me, em verdade, pensativo, não poderia ser dada
senão por um coveiro, cemitério não é cadáver, cemitério é espírito, isto é,
espíritos o habitam.
Em re-pensando, em re-fletindo, em meditando, ou simplesmente
masturbando ocasos e acasos, auroras e crepúsculos, perguntei-me, com
seriedade, não com aquela dúvida sistemática do “cogito ergo sum”, o porquê de haver dito a
“minha mão direita é o espírito”. Com ela trans-cendia a alma que se
descompunha no silêncio da cova? Com ela trans-cendia a carne que se desfazia e
mostrava os ossos transparentes e límpidos, a-núncio das cinzas, o fim
peremptório e radical? Com a mão direita escrevia na pedra de mármore a vida
mesma, em sua pureza e inocência?
Após receber a nota de dois reais, pedindo-lhe eu que rezasse e pedisse
as almas ajudarem-me, dissera-me: “Sua mão direita fará sua felicidade, não
apenas no mundo; sua mão direita será sua felicidade além de seu túmulo. Ela
nunca estará vazia, estará sempre cheia”.
Fora embora. Continuei sentado, a pena entre os dedos, delineando os
caracteres, burilando os símbolos, buscando e desejando caligrafia que a
simples olhar, olhar des-compromissado, des-pertasse nos homens uma fala mais
ou menos assim: “Nunca vi letra tão bem feita nos seus arrebiques e contornos”.
Limites... A valsa das “bodas de ganache”, manifestada primeiro nas
orelhas, até as patas ou aos pés seria a-nunciada, re-velada com a caligrafia
bela e perfeita, objeto e louvores da divinidade espiritual dos olhos,
divindade ocular das retinas, o mais que ad-viesse daí seriam os desejos de as
letras atingissem e consumassem as dimensões da vida.
Além de ser gratuito supor que através da beleza da caligrafia, das
letras bem delineadas e buriladas, possa sentir de modo verdadeiro o que é isto
a primeira manifestação das coisas e do mundo, ainda acredito seja mesmo
possível e real sentir os inescrutáveis desígnios graves.
Há quem pense a presença do coveiro, estar tomando cerveja, as almas
traziam-me um buquê de flores, cabia-me extasiar com seu odor, néctar das
“bodas de ganache”, trazia-me a consciência de minha mão esquerda auxiliava-me
sempre, esquerda e direita se uniam, comungaram-se, aderiram-se no verbo do
sonho de ser, a morte trouxera-me a visão límpida e clara de um desejo irei
sempre alimentar no peito, regando com gotículas de esperanças e fé. A mensagem
da vida me fora trazida por um coveiro, re-presentação, símbolo, signo da
morte, as almas protegiam-me.
Pouco se me dá sabê-lo, apesar de, sabendo, ser o melhor, auxiliar-me-ia
inda mais, no de-curso e per-curso do tempo se re-velará; o mais importante,
que me abriu as pupilas para ter a visão mais sensível de sua imagem.
“... de mão cheia”, tais palavras me são lembradas nalgum momento de sua
fala, quando olhando o horizonte ao longo das sepulturas, brincando com os
sentimentos amalgamados à felicidade, riso, dissera-me tão logo o coveiro
despediu-se, indo embora: “a fala é o suspensório da linguagem para proteger o
estilo”.
Aquele encontro, apesar de sua fortuitidade, dizia-me que o meu estilo
de vida só podia ser protegido com a caridade das palavras; não me ri a
bandeiras despregadas, não era o momento, mas por haver trans-cendido tanto
com: “o coveiro chegou, pediu dois reais para inteirar para o almoço,
pedindo-lhe rezasse para as almas me ajudarem”. Contudo, o encontro não se
resumiu nisto, con-versamos, e por estar escrevendo, sempre que passava por
ali, observava-me escrevendo, “... mãos cheias”.
As letras sendo desenhadas, as idéias, sentimentos, emoções, tecendo com
paciência, habilidade, ciente dos limites e liberdades, os verbos de esperanças
ad-versas e reais, a vida sob outros horizontes e uni-versos da palavra, do
quotidiano vivenciário e vivencial, outras real-idades.
Ao princípio, sereno e tranqüilo, desenhando no branco do papel as
letras, habitando-me desejos profundos de “inspiração”, queria algo escrever,
que mostrasse o per-curso e de-curso dos sentimentos e idéias, a sua
manifestação, re-velação, e como me entrego por inteiro em busca do sublime.
Mas não podia jamais imaginar um coveiro se aproximar, pedindo um auxílio,
“vejo o senhor visitando a sepultura da senhora sua mãe; não reza, con-versa
com ela; não podia imaginar seria a continuidade da inspiração que buscava,
queria senti-la inteira em mim, e sendo nela envolvido, a mão direita
traçava-lhe a trajetória, mostrava-lhe o que habitava a alma, o espírito, o
sem-fim da vida e dos sonhos. Despertou-me a mão a fala do coveiro, senti-a
presente, forte, reconheci-lhe a perspicácia, agilidade, seus tendões robustos
e determinados, reconheci-lhe a artificidade dos gestos e movimentos, serem
aqueles dedos que me sustinham a vida, sustentavam algumas outras necessidades.
Ao princípio, custou-me sobremodo parecer o que era dantes, não a
olhava, não prestava atenção em seus momentos, pré-ocupado a penas deslizar as
imagens de forma que originou a caligrafia agora a ciência de ser ela a
artífice de minha vida sob tantos pensados, intuídos, percebidos, sentidos, que
nem sei quantos, perdendo-me e encontrando-me.
O demônio da esperança pousava no meu coração, esperança que me
retificou aos meus próprios olhos, mas as almas vinham dizer serem tolices as
melancolias e nostalgias da morte, as mãos cheias eternizavam a vida, o corpo
pereceria, inevitável, o espírito continuava os seus passos ao longo dos
tempos, séculos e milênios.
Tivera um pesadelo – aproximando-me o aniversário é-me peculiar
pesadelo, e este dizia respeito a inspirar-me profundamente, desde as
pré-fundas ao espírito. A princípio, não me fora possível, por mais tentasse,
conciliar o sono; voltava-me de lado para outro, irrequieto, impaciente, vendo
as imagens de Horácio e Sófocles; traziam no rosto e semblante os traços do
sofrimento e desejos divinos, os coveiros e as caveiras, ouvindo as notas de
uma valsa nas “bodas de ganache”. A muito custo peguei no sono. Antes não
pegasse! Sonhei que era Hamlet, trazia a mesma capa negra, as meias, o gibão e
os calções da mesma cor, montado em Incitatus que dançava ao longo de sua
marcha cadenciada, tinha ele a certeza e convicção de para onde estava levando
Hamlet, estava determinado em cumprir o trajeto com todos os méritos e
dignidades, era forte, robusto. Tinha a alma do príncipe da Dinamarca.
Analisando de modo simples, aquela peculiaridade da olhadela de
esguelha, achei natural aquele pesadelo, enfim... Nada houve que me assustasse.
Incitatus levava Hamlet numa cela posta em seu lombo, cavalgava. Também não me
aterrou ver ao pé de mim, vestido de Horácio, um hóspede do hotel com quem
troquei umas palavras no refeitório antes de subir os degraus da escada, deitar
e dormir. Saímos o hóspede e eu de cara para o cemitério do outro lado da rua.
Atravessamos. Pareceu-nos ser a Avenida Dom Lúcio Serafim, e entramos em um
espaço que era metade cemitério, metade sala.
Nos sonhos há confusões dessas, imaginações duplas ou inexplicáveis,
incompletas, mistura de coisas opostas, ambíguas, dilacerações, desdobramentos.
Enfim, como eu era quem observava Hamlet montado em Incitatus, e o
hóspede do hotel era Horácio, tudo aquilo devia ser cemitério. Tanto era que
ouvimos logo a um dos coveiros esta estrofe:
Apesar de você
Amanhã há de ser
Novo dia
Como na tragédia, deixamos que os coveiros con-versassem, falassem entre
si, enquanto faziam a cova de Leonarda Virgem dos Pinheiros que li na lápide da
sepultura.
Não entendi bem; depois do enterro, os coveiros faziam saltar das
sepulturas as caveiras, dizendo-lhes graças e jogando-lhes pétalas de rosas
brancas. Demos mais alguns passos, até que eles nos viram. Não se ad-miraram,
foram indo com o trabalho de capinar e limpar as lápides.
Poucas horas depois, um dos coveiros a quem havia visto sempre desde o
falecimento de minha mãe se aproxima, pedindo-me inteirasse seu dinheiro para
almoçar com dois reais, pedindo-lhe rezasse
para as almas ajudarem-me, olhando-me que escrevia, dissera minha mão ser
cheia.
Precisava sentir-me inspirado mesmo, desejava conhecer de perto a
inspiração, saber-lhe, daí criando novos horizontes e uni-versos.
Saindo o coveiro, continuei deslizando a pena orientada pela mão que era
a artífice da vida, que era a sua continuidade perene.
Lembrou-me, na juventude, rapaz de vinte e dois anos, haver lido um
texto cujo questionamento era o futuro das mãos, quando não mais delas
necessitassem os homens; não era filosófico, poético, científico, linguagem um
pouco técnica e didática, por algum tempo pensei a respeito, analisei. A
máquina de escrever, o computador não me substituiriam as mãos, só a partir
delas eram e seriam operados.
Busquei poucochinho ansioso na memória uma trova das mãos, não me sendo
possível lembrar, um excerto de um livro, em verdade, um pensamento de outro
livro em prosa “Mãos vazias”, para dar continuidade a este texto, em princípio
buscando inspiração e nada me surgia, embora a pena deslizasse no papel
delineando os caracteres, burilando a forma de ornamentos, sem qualquer
inter-ferência da busca de continuidade da inspiração. Era ato espontâneo e
livre de minha mão direita, era-lhe inerente desenhar caracteres e tecer os
pontos das dimensões sensíveis todas, era-lhe inerente o sublime dos movimentos
e gestos do polegar e indicador.
Transcendi: não mais observava idéias, sonhos e sentidos, dúvidas e
re-flexões da vida, observava apenas o deslizar da pena, comedido, sereno,
tranqüilo, a sapiência e sabedoria das letras a ad-virem, como as modulava, o
que me ad-mirava, e na ad-miração o desejo de não mais interromper, continuaria
sem limites, sem pressa, não diria sem margem por ser ela o contorno da página.
Chegava ao ponto de estabelecer, não sei se diga preceito filosófico ou
simplesmente lema, de não me levantar da mesa enquanto a inspiração não
sentisse o desejo de refestelar-se no uni-verso de todas as letras que foram
modeladas para expressar e revelar a vida que me habitava as pré-fundas da
alma, interstícios do espírito; não sairia dali com as mãos cheias de palavras
que não foram desenhadas e modeladas, sairia com a mão direita vazia, a mão
esquerda que acumulara nelas outras não ditas em breve depositaria nela, na mão
direita, terna e carinhosamente, as letras que teceriam outras.
Ousei algumas estrofes, inda que ad-versas ao espírito da continuidade
da inspiração, pensando no que me viera à intuição quando tecera as seguintes
palavras: “não sei se diga preceito filosófico ou lema”:
Assim,
Sentimento e emoção
Ou re-versos e avessos
Da razão ou sensibilidade
O simples se re-faz nas pré-fundas
E nelas as simples palavras
Transcendem o sonho mágico
De ser re-velação
E não atitude de manifestar
A linguagem e estilo do
ETERNO.
Se era preceito filosófico o poema criado para ser o suspensório, que
moldasse a linguagem e estilo da inspiração que me habitava inteiro, e eu com
engenhosidade traçava a pena a sua face e semblante, não poderia res-ponder num
abrir e fechar de olhos, passo de mágica. Cria de modo ímpio serem os versos
que criara a imagem límpida e transparente do sublime que a inspiração
re-velava.
Boa ocasião se me apresentava – o coveiro era a pena passada, uma vaga
lembrança na alma, memória sensível de que me pedira inteirasse seu dinheiro
com dois reais para almoçar, atinei-me com estar ali, escrevendo, tomando a
cerveja, acompanhada de aperitivos, havia tempo considerado, umas duas horas –
de saber se efetivamente a vida feita pelas mãos era artífice do sublime que se
re-vela na inspiração; se com elas as virtudes e valores humanos são dimensões
que elevam os ideais e sonhos, se imbuído deles as mãos se estendem, e a
direita “cheia” a-“núncia” o eterno.
Com vagar ia sepultando as dúvidas, ia sepultando as indecisões, ia
sepultando os medos, até tocar-me o coração porque eram idéia e desejo, desejo
e pensamento a vida espontânea e livre anunciar a origem do sublime à luz da
mão direita que traça a id-“entidade” e espírito, a morte corromper o sangue e
retirar-lhe o princípio.
Vida,
Amor, sonho
Verbo
Desejo, vontade
De con-“templar” o eterno
De con-templ-“orar” o sublime
Equivocado no imortal,
De viver o nó,
Éter de vivências e quimeras
Do ontem olvidado no futuro
Do futuro esquecido ontem
Nestas páginas,
E, além,
O verbo do amor
“Re”-cordado.
Seria quem dava mostras, “de-monstrava” a realidade da inspiração,
atribuindo arrebiques e ornamentos à teoria dos ventos e às idéias que revelam
a face outra da vida e morte Natural, verdade imortal, valer não só a imagem, a
moldura que a a-colhe e re-colhe, mas os dois principais característicos
humanos, perderem-se, infringirem a lei e a moral.
Agradeço à mão direita, comovido e emocionado, tão insigne o obséquio de
sentir que acrescentar a inspiração do sublime, ou o sublime em busca da
inspiração é modo de sensivelmente servir à vida, ao espírito, aos sonhos de
amar verdadeiramente a imaginação, comungando a dor presente ao especulo dos
inescrutáveis desígnios simples e virgens, flor de ilusões e “esperanças de
ser”.
Inspira-me
Inspiração das nuances
Da vida e morte
Dos graves desígnios
Inescrutáveis...
Iria a pena onde a mão a mandasse, - às estelas se lhe desse as asas da
água – ao fundo da terra, se lhe ensinasse o talento da formiga. Nada mais me
ad-mirava senão o morrer o sol e nascer a lua, e contar as estrelas. Quiçá
estivesse numa igreja, escrevendo estas palavras, cairia aos pés do Senhor,
derramando lágrimas de gratidão; tantos, não sei quantos, momentos vividos,
fazendo a mesmíssima coisa, e não haver prestado atenção nos gestos e
movimentos da mão nos dedos, a presença forte da inspiração... Verdade é haver
algumas vezes desejado isto, não me fora possível, talvez não estivesse ainda
amadurecido o suficiente para deixar a mão direita ser envolvida na inspiração,
deixasse-lhe ser a inspiração, ela escreveria. Realização, poesia, divindade,
tudo trocaria por ser a mão direita tecendo as letras de minhas pré-fundas,
entranhas, sonhos e desejos de outros horizontes e uni-versos; de porfia com o
sol, virá o brincar nos meus cabelos grisalhos os ventos do éden, a pena
refestelar-se-á por todo sempre, coitada, não descansou um segundo qualquer,
acompanhando-lhe a mão direita, e ninguém para dizer: “descanse em paz”.
Ninguém sentia o peso da ociosidade. Vivia na contemplação. Pôde a mão ir ao
paraíso, onde tudo lhe era avesso e di-verso.
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