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terça-feira, 24 de novembro de 2015

ADEMAIS... AO IN-VERSO DE LIAMBAS E LIMITES Manoel Ferreira




A máquina de escrever auxiliara bastante a quem tinha o hábito irreversível e imprescindível da pena, profissionais de todos os níveis. Manuscrever páginas e mais páginas cansava muito, os dedos doíam, e não era algo de nível às exigências do sistema. Só havia um problema: o erro de datilografia existe por mais exímio seja o profissional, em documentos oficiais não podiam figurar um único. Era necessário datilografar vezes e mais vezes até não figurarem. As exigências do mercado se posicionaram e daí surgiu o corretor. Ajudou bastante.
Por mim, exigente como sou, usar a máquina de escrever era um martírio: pretendia não houvesse um único erro, ademais que um amigo íntimo dissera-me que não leria páginas com erros de datilografia. Muito sacrifício, e mesmo assim ainda figurava um erro aqui e ali. Preferia, então, manuscrever, o que me ajudara a melhorar a caligrafia, modo e estilo de aproximar-me do estilo original, o barroco-contemporâneo.
Com a aparição do computador, tudo se tornou muito simples: corrige-se, enquanto se está escrevendo, e qualquer erro é eliminado da página, agradável e saudável a leitura. De novo, muito me auxilia o computador para a escrita quotidiana, e, ademais, ajudara-me a desenvolver a linguagem, a ortografia, a correção gramatical, e, assim, transcendi, aperfeiçoando a linguagem erudita e clássica.
As facilidades se tornam problemas sérios e pujantes. Adquiri a preguiça de manuscrever qualquer página, e, em verdade, de escrever de qualquer maneira, até assinar o nome. Não tenho a preocupação com a caligrafia, enraizou-se em mim, não houve qualquer mudança.
Às vezes – era mais assíduo há uns nove meses -, sentado em bares ou botequins, tomando a branquinha, garatujo palavras em papéis quaisquer, guardanapo é o mais comum. Chegando a casa, digito, fazendo as devidas correções.
Surgiu um outro problema. Não adianta comprar caneta, sempre a perco, até no mesmo dia da aquisição. Necessito dela para alguma eventualidade, e se procuro alguma no escritório nas gavetas, sobre a mesa, pensando haver alguma jogada por algum lugar, não encontro.
Numa eventualidade, peço emprestada a caneta, dizendo a quem peço ser um escritor sem pena, o que dá possibilidade de interpretações as mais críticas e irônicas: os oportunistas que se sentam nas cadeiras de academias e não têm uma única palavra escrita, não escrevem nem bilhetes para a empregada ou a amante; não tenho quaisquer pejos em ser crítica, não tenho pena do criticado, mostro-lhe as feridas mais íntimas. Há algumas pessoas, na maioria conhecidos e amigos, que compreendem haver sarcasmos nestas palavras simples: “sou um escritor sem pena”, mas há quem apenas entende a situação, não tenho caneta para assinar o nome, tomar nota de um telefonema ou coisa parecida.
A problemática vai muito além dessas simples picuinhas que estou registrando com tanta facilidade, os dedos tocando as teclas rapidamente: se manuscrevo os textos, as idéias ficam ceifadas, multifaceladas, não consigo concatenar os pensamentos. Isto porque estando a digitar, retornando a todo momento para ler, avaliar se não poderia acrescentar, esclarecer algum sentido, suficiente tocar a tecla de “enter”, dando um espaço, incluindo o que estava obscuro, enfatizando alguma emoção ou emoção. Manuscrevendo, isso não é possível, a menos que faça anotações dos lados da página, o que jamais fiz.
 Interessante... Faço uma autocrítica, e por fazê-la consciente, sabedor dos auxílios e prejuízos, não tenho qualquer vontade ou desejo de passar a manuscrever os textos – não por preguiça, por haverem falhas e ausências na construção das idéias, mescladas de sentimentos e emoções os mais diversos, mas simplesmente por guardar papéis não é coisa aconselhável, quando menos se assusta só há papéis por todos os cantos. Já pensou guardar sete mil e tantas páginas num escritório: não se anda, não se faz nada nele, isso se for possível entrar no espaço.
Se penso melhor nessa autocrítica, não encontro quaisquer justificativas ou explicações – aliás, é muito difícil viver sem justificativas ou explicações, inda mais estas por serem dimensões espirituais, aquelas são de nível da alma, da contingência, que muitas vezes se confundem com as fugas e medos. Para que as justificativas ou explicações? Para o fato de não me dispor a manuscrever os textos.
Em verdade, explicando-me com consciência, a nível espiritual, transcendendo as picuinhas, tenho a dizer que só digitando os textos é que me sinto tranqüilo, auxilia-me na exigência da linguagem clássica, erudita; só na digitação é que me acho seguro, é realizar o que em mim habita com pujança e contundência.
Não obstante, se deixar qualquer erro gramatical, tenho a certeza de que a lâmina do machado descera sobre a minha cabeça com toda a categoria. Ademais, os erros vão satisfazer o “ego” de alguns que têm a ousadia e pretensão de afirmar aos quatro ventos que tenho inveja deles, não sou querido como eles, não sou o motivo de encômios os mais diversos possíveis. Se não satisfaço o ego dos leitores com as historietas de comadres e compadres, as picuinhas de simples e humildes, como eles mesmos dizem no que isto tange.
Nalguma dimensão da linguagem e estilo necessito das luzes da ribalta incidindo sobre a minha calvície, que vai bem adiantada, se não tomar cuidado só restarão alguns fios de cabelo próximos às orelhas, na borda delas, sendo a direita maior que a esquerda – obviamente, não se tratando de orelha de abano. Creio que as destes homens que dizem sou quem os inveja, não conhecendo esta realidade, é inconsciente, são as verdadeiras de abano, pois não se sentem presas à cabeça, que, ademais, comanda todo o corpo.
Alguém me dissera, um doutor em Literatura, alguém de relações mais que íntimas, isso só Deus pode explicar com categoria, pois as dimensões de nossas relações se fundamentam inda mais na espiritualidade e religiosidade, trata-se de meu compadre, o maior crítico que tenho, que não é fácil entender-me e compreender, é necessário um conhecimento prévio, mas a linguagem e estilo encantam os homens, devido à linguagem poética, havendo dimensões que são chaves de minha sensibilidade.    
Agora, necessitando de uma caneta para anotar um telefonema não encontrei, o que me obriga a memorizar, o que não me é difícil, um sacrifício. 

   

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