Ler Aline – o melhor no melhor dos
mundos de nosso escritor curvelano, Dalton Canabrava Filho, significa estar
diante de uma obra completa no tangente à interpretação, à análise. Sem dúvida,
o autor apresenta-nos uma obra iminentemente crítica à luz da filosofia –
lembremos Voltaire quem dissera: “se queres discutir, defina os termos”.
Nossa intenção é discutir, é definir os
termos. Aline é uma sátira, sátira de gerações, de jovens cujos sonhos
transcendem a realidade, a contingência em busca de novos valores, de algo na
vida em que se pode acreditar, não apenas uma ideologia , não apenas um
sentido, mas que algo proporcione a realização enquanto homem, enquanto
indivíduo. Jovens que se entregam inteiros aos sonhos de novo sentido de viver,
na contramão de gerações passadas de idéias antigas que não mais significam
coisa alguma.
Medo e esperança se confundem. Não
desistem de continuar a sonhar. Na água límpida das fantasias tomam goles de
desejo e vaidade. Lavam-se das neuroses e traumas que outras gerações lhes
deixaram de herança. Acreditam que podem modificar, transformar o mundo.
A definição dos termos, à luz de
Voltaire apresenta-se lúcida. “Ninguém sabe o
dia de morrer. Quero viver para a paz. Que importância tem ficar acumulando
coisas...”. Qualquer
geração que anteceda a outra vive como se soubesse o dia de morrer, e a ironia
é que a vida são conflitos e traumas, a alma são neuroses e psicoses as mais
variadas, ao gosto e prazer de cada um. A sátira é acumular coisas. Os jovens
não desejam acumular coisas, querem viver e desfazer-se delas, o mesmo de
trocar de camisa à mercê das situações e circunstâncias. Esvaziam-se. Só o
vazio pode acolher o múltiplo. E o
múltiplo é o que ainda está por vir. Vivem como se o amanhã não
existisse e se o futuro fosse apenas uma idéia vulgar e simplória.
O que é isto – a moral? O que é isto –
a ética? O que é isto o para-sempre?
Dalton Canabrava Filho mergulha no
conflito das gerações numa linguagem e estilo que, a princípio, revela-se
séria, mas nas entrelinhas a seriedade se dilui e se apresenta o riso e a
gargalhada. Rimo-nos de nós adultos, que acumulamos neuroses e psicoses e nos
julgamos os mestres das verdades absolutas. Rimo-nos de nossas mazelas e
picuinhas, de nossos achaques e pitis. Todos rimos seja desta ou daquela
geração.
Nosso escritor curvelano, quem visitou
vários países da América Latina, tendo vivido na França, traz em seu alforje as
experiências de uma juventude francesa de 1968. O importante a sublinhar e
ressaltar nestas suas experiências é que sua obra nos traz aos curvelanos um
novo prisma de visão das letras. Não conheço um único escritor curvelano que
faça rir os leitores, que satiriza os costumes de modo tal que não resta outra
alternativa senão nos conscientizarmos de nossas palhaçadas no que concerne a
valores, a princípios.
Dalton Canabrava Filho mostra-nos aos
curvelanos outros níveis da condição humana, mas sendo curvelano não conseguira
neste seu primeiro livro – acredito que nunca o conseguirá – escapar da
característica maior dos escritores curvelanos: o verbo que se torna carne.
Não o conseguira por essa dimensão da
alma/espírito curvelanos habitar os mesmos, ou seja, o desejo de uma redenção a
partir da realização dos sonhos e desejos de encontro consigo mesmos. Os curvelanos
desejam revelar o seu íntimo.
O Verbo que se torna carne de Dalton
Canabrava Filho é a ironia, o sarcasmo, a mofa, a galhofa...
Lendo sua obra encarnamos o riso de
todos os valores falsos, dos falsos princípios, se não mais rimos, se
interrompemos o riso por instante, é que desejamos alguma mudança...
[1]
Esta crítica à obra de Dalton Canabrava Filho fora já publicada pelo tablóide
Centro de Minas. Fora uma de minhas primeiras críticas publicadas. Se decido
agora re-publicá-la é que, acredito, os leitores não a têm. Ninguém tem costume
de guardar jornais, e é uma obra que merece inteira divulgação. Nada fora
modificado nesta republicação.
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