Não toco as pirâmedes de Queóps. Dedos tamborilam
cinzas e fumaças.
Hora. Tempo.
Oito horas e quarenta e cinco minutos.
A distância, o morro afiguram-se desfeitos.
Mar de demônios... Lanço a corda e alguém devia
descer para retornar com a mulher. Lavo os pedaços rudes de pedras. Um prazer
estranho penetrando a luz pelas frinchas da janela. Muita palavra para o pobre
muro de cimento.
Solto o ar no fim do dia. Gestos amargos na boca.
Perdi a amargura da solidão. Reliosa solenitude desta noite. A deusa é um riso.
Imagens de voz fazem oscilar a luz da lâmpada. Galgar e vagar de mortais.
Vísceras. Reticências mudas e surdas lançam recursa
a prazeres ilusórios. Água empanada de risos e gargalhadas. Taça nas águas.
Sonho povoado de expressões. Apoteose. Nostalgias. Luzes. Voz soprando nas
longas alamedas do sono. Rosto navegando barcos de brinquedo.
Sinto saudades.
Relembro passos.
Revejo o sorriso, o olhar.
Ouço letras desconexas.
Vontades.
Esperanças.
Vidraças. Encruzilhadas. Feições expressiva se
eliminam ao reconhecerem o lugar em que iniciaram imagens.
Abro a torneira do chuveiro. Deixo a água cair. No
chão, vários produtos de beleza e higiene pessoais. Tão pequena esta casa de
banho. Fecho um pouco a torneira. Detesto água fria ou morna. Puxo a cortina de
plástico. Ensabuo o corpo.
Devo fazer um esforço para dissipar-me. Olhar
cheio.
Registrar o que em nada esclarece. Sou mulher
sustentando um corpo. Beleza. Sensibilidade. Nada... remete-me ao futuro.
Negando o racional e rejeição. Se não mostrar sou capaz de um último ato em
nome de ser a minha verdade. Confessar esta atitude causa-me prazer em todas as
dimensões. Mulher.
Deixo a água escorrer no corpo. A voz sai da boca.
Expressa-se na parede. Desliza-se. Escorre no ladrilho, buscando o chão.
Mistura-se á água que escorre. Ouço. Não a sei dizer...
Ouço palavras. Nada compreendo. Não posso entender
o que diem. Deixo os olhos irem deambular no interior da voz. Solitários, sendo
a leveza de estar solta. Não há angústia. O carinho anda cambaio pelas arestas.
Loucura. Seduções.
O corpo frouxo no chão. Ladrilhos amareliçados.
Vago a esmo pelo universo das coisas às avessas.
Quem sou?
Os dedos da mão não se mexem. Nunca desejei
encontrar-me. Com que propósito? Encontrar-me não me liberta de haver sido a
mentira. De ir residier numa sepultura.
Encontro-me de pé.
Olhos de lágrimas. Abatimento. Amenizo o mover dos
pés. Vago no jato de luz morta. Arrasto a sandália pelo chão da casa.
Porque estar no mundo? Nada pode explicar como fui
escolher a mentira. Guardar a paixão. Nada sou. Não posso perceber. Dimensões
sensíveis perdidas por haver escolhido...
Um abraço de despedida. Acenar de mãos. Voz. Manhã
do desconhecido. Um arrastar de formigueiro vem de muito distante. Restos de
mim erguem-se brancos e brandos.
Manoel Ferreira.
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