Luz, sentido e palavras... Viver febril. O coração
forte, descompassado. Tudo, nada. Vazio, caos, abismo. Luz, sentido e palavra.
"Acabemos com isto e
Tudo mais,
Ah, que ânsia de ser rio
Ou cais..."
Palavra, sentido e luz. Nada, vazio. Espreguiçam-se
em ressacas.Vácuo. Vácuo. Subterrâneo frouxo. Eternidade. Fosso chilro.
"Quem é sensível sabe,
Ou ao menos já soube,
Onde coube o paradoxo".
Pequena passageira que fala, gesticula, monologa,
goza. Forças para amar. Além do medo. Disposição para ouvir. Além das
resistências, dúvidas. Sensação de sonho. Natureza diferente. Coragem para
viver. Além das inseguranças, carências. Êxtase. Razão e raciocínio. Segurança
para pensar. Além de pensamentos e idéias. O campus cria segunda realidade para
habitar. Olhar desviado. A luz rodopia sobre a cabeça. Tudo suspenso. Loucura e
insanidade. Sangue no corpo. Conheço o som de caixão. Morte... Morte...
Luz, sentido e palavra.
Palavra aqui, outra ali. Reflexos. Contingência.
Especulo, medito e reflito.
"Desço desta solidão
Espalho coisas sobre um chão de giz
Há meros devaneios tolos a me torturar
Fotografias recortadas em jornais de folhas
amiúde..."
O proscêncio absolutamente vazio. O tablado nu.
Pequena estiagem que disfarça o olhar fixo numa
alegoria ou num pó. Única vela que retoma santos num símbolo nu, num signo. O
país prende a respiração. Salmos na igreja de Cristo estendem os braços...
Desejo recente, forte, definitivo.
Luz, sentidos e palavra... Ruas imersas em sombra
progridem da arte a consciência humana.
Solidão. Delito inconsciente. Correntes internas.
Tudo. Vento. Mudo vestígio do caos. Silêncio, silêncio, silêncio... Muros
mitológicos de sonhos.
Sonhei. Não sei se foi ontem ou anteontem. Pouca
diferença faz. Ansiedade por conservar-lhe na memória. Dilema existencial
suculento. Tramar é "aferir" a vida, penetrar o mundo, buscar forma.
Os rituais poéticos re-presentam a trama de forma simbólica.
Luz, sentido e palavra. Caos, balbuciando. A coisa
que reprimo disfarçada. Explosões de cor, camadas de oceanos, nuvem de
inconsciência, cerzindo a onipresença. Luz, sentido e palavra... Abismo,
surrando. Nada reprimo. Nada disfarço.
"Ninguém
mais
quer crer
na
eternidade...
Sonho. Estou do lado de cá de um rio. Suas águas
são claras. Um som cinza vindo de não sei onde (em ondas). Brinco com uma
criança de aproximadamente dois anos. Está envolta num pano. Alguém brinca
conosco e eu digo: "Não vamos deixar que vejam as partes íntimas..."
Viro-a em direção ao ventre. Beijo-lhe o pescoço de modo afetivo e carinhoso.
Alguma coisa havia terminado. Meu Deus!...
Luz, sentido e palavra... Será que medo não é
notícia? O choque causado por um pequeno fato in-explicável. Eu. Aparição da
morte. Surgimento de morrer. No meio da nevasca, abandonaram-me. Órgãos oficiais
da imprensa.
A criança em mim in-verte os desejos. O ser
dissimula o modo de viver a realidade. "Sou mulher indefesa,
fraca..." Tinha de atravessar o rio a nado. Não era largo, largura
considerável. Temo não conseguir. Algo do outro lado. Não é ponte. Algo feito
de madeira. Pessoas entraram na água. Entreguei a criança a alguém. Quem a
recebe é um cachorro, com os dentes presos em sua roupa. Entrega-se. A alguém.
Lembro-me de que a minha cabeça estava prestes a mergulhar inteira.
Vênus nas duas faces da razão louca esculpe a louça
no silêncio casmurro. E descrever isto com a realidade nas mãos. Uma mulher sem
realidade. Sem realidade. Persona. Quem sou eu? Muita hipocrisia. Serei eu
hipócrita? Meu Deus!... Mão frágil. Seguro o cigarro. Os dedos tremem. Os olhos
deambulam sozinhos.
Poder dizer: "Sou quem sou..." Ah, quando
isso irá acontecer? Se acreditasse... Não acredito?
Não é sonhar. Sou quem sou. Busco transferir o
desejo para alguma coisa que amo. Alguém a quem amo. E sou quem ama? Sou eu
quem não ama?
Não sei em que me tornei. Vontade de chorar.
Não há angústia possa resistir. Será? Será eu quem
sente? Ser humano. Nada disto é mentira. E por que não viver quem você
é?!" É em mim. Em mim...
A realidade existe. Não é re-presentação, fantasia.
Manoel Ferreira
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